E se todas as ruas Chile do mundo inteiro se juntassem em uma perpendicular que se estende ao longo dos países e dos territórios chegando a invadir todas as outras ruas de toda cidade, vilarejo, povoado? E se todas essas ruas Chile do mundo inteiro juntas cruzaram o Atlântico? E se entre todas essas ruas Chile do mundo inteiro ao invés de criar uma ponte, de tantas ruas Chile que são, conseguissem fazer um efeito de sutura sobre o Atlântico entre os dois continentes, América e Europa? E se essa costura zigzagueante como uma serpente atualizasse os fluxos migratórios e as correntes marítimas? E se todas as composições arquitetônicas e as tramas que o tempo teceu em todas as ruas Chile do mundo nesse ziguezague caem ou ficam todas salgadas, recobertas pelo sal do Atlântico e vão se quebrando lentamente? Ou simplesmente, e se uma nova evolução dos seres marítimos saísse do fundo do fundo do fundo do mar e ocupasse todas as ruas Chile do mundo inteiro ziguezagueantes sobre o Oceano Atlântico nessa espécie de ponte serpentina que costura uma ferida nunca cicatrizada?
E se a rua Chile situada na cidade de Salvador no estado da Bahia fosse ocupada por todo o movimento estudiantil e feminista do Chile, aquele que pixou durante as movilizações pré-pandêmicas: “El neoliberalismo nace y muere en Chile”? E se essa forma de extrativismo chamada Chile como formação do estado-nação mais ao sul, mais ao pacífico, mais cordillerano, brotasse no meio à rua Chile, enchesse a rua de araucárias, e os povos mapuche, declarados como terroristas pelo Estado chileno morassem no prédio 6 estrelas da nova rua Chile?
E se a rua Chile tivesse o cheiro do Oceano Pacífico ao invés do Oceano Atlântico? E se as esculturas moais invadissem a rua Chile sendo elas as que habitam todos os espaços e os prédios após a reforma?
E se uma placa tectônica da rua Chile se desprende em um forte terremoto que desaba todos os prédios dos quarteirões que ocupa, sendo as ruínas levadas para o fundo do oceano por um tsunami?
E se Walter Benjamin tivesse escrito sobre a rua Chile? E se um paralelepípedo da rua Chile tivesse sido guardado no escritório onde ele escrevia suas reflexões? E se esses paralelepípedos da rua Chile pudessem sentir coisas como o Walter Benjamin? E se uma possível escrita sobre a rua fosse massageá-la do início ao fim? E se essa massagem coletiva da rua Chile fosse nem só com as mãos como com o corpo inteiro? E se, com olhos abertos, olhos fechados, esses corpos que massageiam e reescrevem a rua Chile reinventam uma outra arquitetura, outra paisagem? E se ao massagear os prédios, ruas, árvores, plantas, carros, contenedores, asfalto, as sensações, os pensamentos, os sentimentos, as emoções, as dores da rua Chile se transformassem em energia através da qual se invoque o espírito de Walter Benjamin?